Homilia da Ordenação Prebiteral do Diác. Gonçalo Aranha


Livramento (Catedral), 07 de Julho de 2012

ORDENAÇÃO PRESBITERAL diácono GONÇALO

Leituras:
 Is 43,1-7; Sl 109; 
Ef 4,1-7.11-13; 
Jo 15,1-8

Saudações: queridos Padres, religiosos e religiosas, amados seminaristas, prezados irmãos e irmãs que vieram da Diocese e de tantos lugares: que o Senhor da paz dê a vocês a paz sempre e de todas as maneiras (2 Ts 3,16). Uma saudação especial quero dar à família do nosso diácono Gonçalo, à mãe, d. Nice e o pai seu Antônio, às irmãs, aos vós e parentes todos.
Querido Gonçalo, hoje é dia, antes de tudo, de agradecimento a Deus que nos reúne em seu Filho qual Assembleia santa, no Espírito. A ordenação presbiteral – de padre. como o povo diz – é acontecimento que marca nossa caminhada eclesial. Considero um sinal da bondade do Senhor receber mais um filho em nosso presbitério para podermos aprimorar o serviço ao povo de Deus.
Agradeço, de coração sincero, à família que doa a igreja seu filho, aos formadores que contribuíram para a realização da obra, aos numerosos e numerosas zeladoras da OVM que tanto cooperam com suas orações e a ajuda econômica, aos padres que incentivam os jovens, com seu exemplo, sobretudo; enfim, a todo o povo que colaborou de diferente maneira.
A Palavra de Deus nos ilumina, aquece nossos corações e ajuda na compreensão do que estamos fazendo. Iluminados pela Palavra, refletimos a respeito da identidade do padre na atual realidade social e eclesial, encontrando inspiração no ensinamento de Jesus e da Igreja.
a) O profeta Isaías tem consciência de que o chamado vem de Deus: Chamei-te pelo nome: tu és meu! Junto com o chamado, Deus dá os dons necessários: a cada um de nós foi dada a graça na medida do dom de Cristo. O apóstolo Paulo (II leitura) o afirma com clareza, e recomenda a necessidade de andar de modo digno da vocação a que fostes chamados (Ef 4,1). Assim, acontece o que pede Jesus: permaneçam em mim, como eu em vós...e produzirão muito fruto.
Os textos bíblicos e as orações da liturgia apontam, de maneira essencial e exigente, as características do chamado ao ministério. Ser ministro ordenado pede um apaixonado amor a Jesus e à Igreja, sobretudo aos jovens e aos mais marginalizados. A igreja hoje nos chama para realizar a “nova evangelização” com um anúncio convicto, fiel e generoso (cf. João Paulo II, Pastores dabo vobis, 10). Como ser “imagem viva e transparente de Cristo” em nosso ministério (cf. PdV, 12)? Como ‘prolongar a presença de Cristo, único e sumo Pastor, atualizando o seu estilo de vida no meio do rebanho’ (cf. PdV 15)?
a) A primeira exigência para ser digno da vocação é a de cultivar um relacionamento com Cristo qual “razão de ser, origem do nosso agir, motivo de nosso pensar e sentir” (DGAE, 4). Com as Diretrizes gerais devemos nos perguntar: “O que significa acolher Jesus Cristo, segui-Lo e anunciá-Lo? O que há em Jesus Cristo que desperta nosso fascínio, faz arder nosso coração. leva-nos a tudo deixar?”
Fundamentados no amor a Jesus Cristo, a partir de uma intensa experiência de fé, pede-se a capacidade de fazer algumas escolhas e, consequentemente, algumas renúncias.
b) Coloco a humildade como primeira. Somos ramos da videira; a força vital está na videira, sem esta ligação íntima ninguém dará fruto: sem mim, nada podeis fazer (Jo 15,5). Esta dimensão, alicerçada na imitação de Cristo, faz-nos agir de maneira delicada e atenciosa, firme, mas não arrogante, decidida e não prepotente. Algumas atitudes não condizem com o ministério! O ministro ordenado não tem nenhum poder de mandar e desmandar, de chegar ao Conselho Pastoral ou num grupo só para dar ordens e com programas já definidos. O único poder (exouxia) vem de dentro, nasce da Palavra e ensina a viver na fidelidade à Palavra, por meio do diálogo, da atenção dedicada e inteligente à realidade e às pessoas.
c) Quero evidenciar uma segunda dimensão, é a imitação de Jesus que se fez pobre, sendo Ele rico (2 Cor 8.9). A tentação de possuir bens materiais, não só hoje, é muito forte. As riquezas dão – ao menos no início – segurança. Mas, Jesus percorreu e traçou um caminho diferente, com total desapego afetivo e efetivo dos bens materiais. A capacidade de usar estes bens com sobriedade, tem sua razão na imitação de Cristo: Ele que era rico se fez pobre (cf. Fil 2); é o amor que faz imitar.
O que vale para todos os discípulos, é exigência absoluta para os ministros da Igreja. A tentação de uma vida cômoda e burguesa nos ameaça; como o desejo de privilégios e de status – pode ser de status clerical, isso desde o tempo do seminário. Mas este estilo de vida contradiz nossa escolha! Sem a constante procura de imitar Cristo na concreteza de uma vida despojada, também o amor a Jesus tornar-se-ia só imaginário. Recomendava o Concílio (no decreto sobre a formação: Optatam Totius, 17): “Os sacerdotes devem ser capazes de testemunhar a pobreza com uma vida simples e austera, sendo já habilitados a renunciar generosamente às coisas supérfluas”.  Insisto para que, desde o tempo da formação, ninguém procure privilégios ou vida tranquila ou sucesso social. Não foi o que Jesus prometeu: quem quer me seguir, renuncie a si mesmo carregue a cruz.
d) Trata-se da cruz da fidelidade. Jesus conhecia a fragilidade humana e por isso, insiste na necessidade que sejamos fiéis. Fiéis a Ele e sua proposta, fiéis à nossa vocação: permanecei em mim, como eu em vós... Aquele que permanece em mim e eu nele produz muito fruto (Evangelho). Não basta se colocar na caminhada de Jesus; que nos desafia é o permanecer. Fiéis nas pequenas coisas, dia após dia; e os dias do homem não são iguais; pode resplandecer o sol ou a tempestade. Ele, porém, permanece fiel e nos sustenta.
A fidelidade tem uma razão ‘teológica’; o sacerdote, como observa papa João Paulo II, “é chamado a ser imagem de Jesus Cristo, Esposo da Igreja” e “chamado, na sua vida espiritual, a reviver o amor de Cristo Esposo em sua relação com a Igreja Esposa”. Isso “exige dele ser testemunha do amor nupcial de Cristo, ser, por conseguinte, capaz de amar a gente com um coração novo, grande e puro, com um autêntico esquecimento de si mesmo, com dedicação plena, contínua e fiel, juntamente com uma espécie de ciúme divino (cf. 2 Cor 11,2), com uma (grande) ternura...” (PdV, 22).
e) Tudo isso, lembre-se amado filho, é possível somente se alimentando a sede e a experiência de Deus, nas fontes da fé. Refiro-me à oração e à Eucaristia. Oração pessoal, como diálogo silencioso e amoroso com Cristo; liturgia, qual expressão comunitária da fé que nos une no amor de Cristo pela força transformadora do divino Espírito. Oração pessoal, alimento essencial que dá vigor ao nosso espírito e a uma autêntica experiência de Deus. No barulho e na correria da vida, as pausas para ficar com o Senhor, são respiro e alimento da fé. e não é fácil encontrar este tempo doado, para se reencontrar. Se não houver disciplina interior e profundas convicções, a TV, a internet, o papo jogado a toa, aos poucos, rouba a Cristo o nosso coração e o vazio interior toma conta da gente.
Insisto, ainda, no valor da oração litúrgica, qual culminância e manancial da vida espiritual. Destaco a Liturgia das Horas e a Eucaristia. Estes dois momentos que nos pertencem de maneira toda especial, devem, sustentar e distinguir a vida ministerial. Nenhum dia, portanto, sem se alimentar com a oração da Igreja e, possivelmente, com a celebração da santa Missa. Insisto pelo fato que observo ser esses ‘momentos fortes’ deixados ou pouco valorizados, enquanto nós ministros temos a obrigação de orar também, para sustentar a caminhada de fé dos irmãos.
f) Enfim,uma última palavra: solidariedade que é como dizer ‘amor concreto’, algo que o presbítero deve viver com as pessoas, como pastor, a imitação do bom Pastor “apascentando o rebanho do Senhor, sob a direção do Espírito Santo” – (isso lhe perguntarei daqui a pouco). Lembre-se, querido diácono Gonçalo: o padre - pastor do povo cristão “foi escolhido de entre o povo” e é “constituído a serviço do povo”. Nunca esquecemos as nossas raízes e a razão pela qual fomos ordenados, consagrados! Eu tenho certeza de que produzirá muitos frutos permanecendo em Cristo como ramo da videira e na escuta atenta e constante qual discípulo da Palavra.
Concluindo. Irmãos e irmãs, falei, sobretudo a mim mesmo, aos padres e aos seminaristas e parece que esqueci de vocês. Mas fiz isso para que vocês compreendam e cobrem. Compreendam, antes de tudo, as grandes exigências do ministério e orem por nós e, hoje, de maneira especial, por este jovem irmão Gonçalo. E também exijam que nós, ministros ordenados, vivamos à altura do serviço eclesial a nós confiado, com as exigências de humildade, pobreza, fidelidade, oração e solidariedade.
O profeta Isaías (I leitura) repetiu com insistência: Não temas... por que estou contigo. Esta é uma certeza de fé. O papa Bento XVI proclamou o ano da fé (começará no dia 11 de outubro). Lembra que “a fé cresce quando vivida como experiência de um amor recebido e é comunicada como experiência de graça e de alegria”; diácono Gonçalo: esta a sua e nossa missão. Ainda o papa: “É o domo do Espírito Santo que prepara para a missão e fortalece nosso testemunho, tornando-o franco e generoso”.
Querido Gonçalo, tenha esta fé, aquela que você recebeu em sua família e nesta rica e bela Paróquia, onde respirou fé e amor. A oração de todos hoje te acompanha e sustentará. Seja com a força da Graça, digno ministro de Cristo em nossa Igreja, vivendo em comunhão com todos os seus irmãos de ministério, em obediência inteligente e generosa com seu bispo e constante disponibilidade para servir amando e amar servindo.
Tenha a certeza: Ele que te escolheu, nunca te deixará só. 


DOM ARMANDO