Continuamos hoje em nosso blog
apresentando a III e última parte da colocação sobre “Assuntos de Liturgia”
feita por Dom Armando, como Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a
Liturgia da CNBB, na última Assembleia Geral (30 de Abril – 9 de Maio 2014), em
Aparecida.
5.
Intervenções
próprias do Presidente
Tarefa própria de quem preside é dirigir a celebração (cf. IGMR 92). A presidência deve ser exercida durante a
celebração toda, com as próprias capacidades, de natureza e de graça[1].
É tarefa altíssima e muito delicada, explicitação da realidade sacramental
dos ministros da Igreja que, pela ordenação sacerdotal, são configurados a
Cristo sacerdote e, portanto, no agir litúrgico são sinal-memorial de Cristo
orante. Como Jesus foi mestre de oração, assim quem preside uma celebração deve
dirigir e animar a oração da Assembleia. Ele não é o único protagonista da
oração, mas o líder sacramental da Igreja em oração, preposto à Assembleia para
tornar atual, no concreto momento celebrativo, o culto do Cristo total (cf. SC
33). Como ministro da Igreja, ele não ora só para si mesmo, mas em nome de
todos e por / para todos, qual instrumento dócil do Espírito Santo[2].
Podemos compreender, então, quanto esse serviço é precioso e insubstituível:
orar com a Assembleia, em nome da Assembleia, para a Assembleia.
Alguns elementos exclusivos do Presidente. Antes de tudo
a Oração eucarística (OE), “centro e ápice de toda a celebração, prece de ação
de graças e santificação” (IGMR 78). Ela não é somente oração, mas memorial, isto é, atuação do sacrifício
redentor de Cristo. Suas palavras não só evocam um acontecimento, mas realizam,
no presente, o evento salvífico da morte e ressurreição do Senhor. Por isso,
expressam a mais alta ação de graças
e a mais profunda súplica ao Pai por Cristo no Espírito[3].
O
que se observa da postura de quem preside, vale de maneira especial na Oração
Eucarística que deve ser proferida “em voz alta e distinta” (IGMR 38). De fato,
todos os textos – observa sempre a IGMR – precisam ser proferidos de modo que
“a voz corresponda ao gênero do próprio texto”, como também à forma de
celebração e à solenidade da Assembleia e levando em conta a índole das
diversas línguas e o gênio dos povos.
Por isso, eis algumas observações. A
Oração Eucarística pede um tom pacato, com breves pausas, com voz serena e
intensa, modulada segundo as diferentes partes. As epícleses, por exemplo, são
de tipo invocativo, o conto da instituição é narrativo, a anamnese é de caráter
evocativo, a doxologia é aclamatória. Numa palavra, o Presidente deve dar as
cores ao texto, interpretá-lo, sendo e sentindo-se guia orante da Assembleia, tornando-se voz de Cristo e da Igreja e
não frio ‘pronunciador’ de palavras impostas.
Algumas partes da Oração Eucarística devem ser cantadas
(nas celebrações festivas, ao menos). É o caso da introdução ao prefácio, do
Santo, da doxologia e, se o celebrante tem dom, também o prefácio, o conto da
Instituição. Se for assim, sentida e rezada, essa Oração se torna o que é: o
momento mais alto da celebração, experiência intensa e alegre de fé viva que
estimula os cristãos a entrarem no mistério da fé e no testemunho amoroso da
vida cristã.
Pertencem
ao Presidente também as três orações presidenciais (cf. IGMR 30) colocadas no
final dos três momentos rituais: no início, a oração do dia; na apresentação
dos dons, a oração sobre as oferendas; por fim, a oração depois da Comunhão.
Trata-se de três textos breves, mas densos, que devem ser rezados com calma e
em tom implorante, em nome da Assembleia toda que sentirá as orações como suas,
respondendo o Amém. Cabe também ao sacerdote fazer outras admoestações (cf. IGMR 31-33) e – muito importante – a homilia[4].
6.
Presidir
é serviço de amor, fonte de santificação, escola de oração
Quem
preside foi escolhido não pelos seus méritos, mas pela graça que o orienta e sustenta
tanto na vida da Comunidade como na presidência litúrgica. IGMR, 93, afirma que
o sacerdote exercita efetivamente a presidência se consegue “fazer sentir a
presença viva de Cristo”. Por isso, concluindo, destacamos:
a) Presidir é graça e serviço de amor, é
colocar-se ao serviço da Igreja. Por isso, quem preside, na pregação é chamado
a anunciar o que a Igreja ensina; na celebração, a ser fiel ao rito como a
Igreja o entrega em suas mãos e não agir como dono (cf. SC 22). Preside melhor
quem mais ama (cf. Jo 21,15-17) e, seguindo o Bom Pastor, entrega-se alma e
corpo ao ministério, servindo aos irmãos em suas necessidades, doando-se em seu
ministério de anunciador da Palavra e animador da Caridade. O vértice da
presidência acontece na ação litúrgica, mas sua justificação se encontra no
serviço pastoral. Somente quem, a partir de Cristo e da Igreja, consome sua
vida pelos irmãos, age coerentemente in
persona Christi na liturgia!
b) Quem preside é, por vocação, educador dos irmãos na
fé eclesial. Para isso, a oração litúrgica é oportunidade preciosa e
delicada. Nela se encontra alimento para a fé e a oração pessoal, a
contemplação orante e a arte de
educar com equilíbrio e sabedoria. Cuide-se da tentação do desequilíbrio, ou da
esquizofrenia, com as consequentes contraposições que, às vezes, são causa de
incompreensões e divisões. Pode acontecer (e acontece!) que a oração
comunitária e fraterna por excelência acabe dividindo.
c) A maneira do
ministro se santificar passa pelo serviço pastoral. Na sua doação, o
ministro, imitando o Bom Pastor, se doa por amor. Nessa doação encontra-se a
nascente da vida espiritual e a garantia da santificação. O Concílio
(Presbiterorum Ordinis 12) afirma: “Os presbíteros são chamados à santidade em
força do ministério e em força das sagradas ações que desenvolvem
quotidianamente”. Quem preside não pode caminhar isolado, mas deve marcar o
passo com o ritmo de sua Comunidade, ficando à frente, apontando caminhos e os
procurando junto com a Comunidade; ele deve celebrar ‘com’ e ‘para’ a Assembleia,
numa relação de simpatia e empatia, com alegria e gratidão, porque está
prestando um serviço que é dom!
[1] Para que isso se torne possível não se pode
presidir muitas celebrações no mesmo dia! É humanamente impossível!
[2] Deve procurar ativar uma dúplice
relação, em sentido vertical e horizontal: favorecer o diálogo da Assembleia
com o Senhor e do diálogo – comunhão na Assembleia reunida.
[3] Em IGMR 79 encontramos os principais elementos desta Oração: - Ação de graças, - Santo, -
Epíclese, - a narrativa da Instituição e Consagração, - a Anamnese, - a
Oblação, - as Intercessões, - a Doxologia final. Observamos, mais uma vez, que
esta Prece não é oração particular do sacerdote; ela é presidencial, isto é, o
sujeito é o nós eclesial, por
isso, exige a participação ativa da Assembleia. As respostas próprias das
Orações Eucarísticas na Igreja do Brasil favorecem a participação litúrgica.
[4] Sobre Homilia, temos o texto do papa FRANCISCO em Gaudium nn. 135-159, muito
rico de sugestões.