Leituras:
At 15,1-2.22-29
Sl 66
Ap 21,10-14.22-23
Jo 14,23-29
Irmãos e Irmãs em
Cristo, convocados para experimentar a presença de Deus na humanidade, a
Liturgia da Palavra proposta para o 6º Domingo da Páscoa possui uma vasta
possibilidade de reflexões sobre os textos bíblicos indicados acima. No
entanto, nesta homilia sugere-se uma abordagem sobre três temas específicos: o
amor, a paz e a comunhão. Por meio deles, podemos colher a grande novidade da
alegria da Ressurreição: a vida nova gerada em Cristo.
O
Amor
A grande novidade da fé
cristã é que o amor faz com que o Filho seja o rosto do Pai. Nossa missão, como
seguidores de Jesus, é tornar-se pelo amor rostos do Filho. Quando escutamos no
Evangelho “se alguém me ama, guardará a minha palavra” (Jo 14,23), não há
dúvidas de que a centralidade do amor é uma condição fundante para assumir a
proposta de Jesus. Diante disso, devemo-nos perguntar sobre o nosso modo de
viver a fé, pois só permanecemos em Jesus se o amarmos. Mas este amor não pode
ser vivido isoladamente, numa perspectiva intimista de querer esgotar em si a
potência de Deus, reduzindo-O. Pelo contrário, deve ser uma ocasião oportuna
para o encontro pessoal com Ele. Além disso, a vivência do amor dos discípulos
pelo Mestre, ou seja, de nós para Cristo, dá-se concretamente pelo amor mútuo
de uns pelos outros. Portanto, se Cristo é “o amor que se dá gratuitamente
[...] N’Ele, nada há que seja desprovido de compaixão” (Misericordiae Vultus 8); então o amor é a nossa grande missão. Quando Deus faz Aliança com a humanidade,
primeiro através de Israel e, em seguida, através de Cristo e da Igreja, percebemos
um grande ensinamento: Deus nos ensina a amar como Ele ama, logo, “o modo de
Deus amar torna-se a medida do amor humano” (Deus Caritas Est 11).
A
Paz
Observemos um detalhe
importante: Jesus dá algo para os discípulos – a Paz. “Deixo-vos a paz, a minha
paz vos dou” (Jo 14,27). Nesse aspecto, é bom entendermos que a paz não é um
sentimento e nem se reduz à ausência de guerras, mas se articula como um estado
de contentamento e completude de vida. Com efeito, a paz aqui é utilizada para
apontar uma restauração da relação harmoniosa com Deus. Podemos identificar na
segunda leitura uma maneira de perceber a grandeza da bênção da comunhão com
Deus, na figura da cidade santa, descida do céu (cf. Ap 21,10). A nova
Jerusalém revela a paz porque foi restaurada pelo Messias. A partir dessa
visão, inspiremo-nos na mensagem de Jesus e acolhamos a sua paz, tornando-a
concreta, suscitando a acolhida, o diálogo e colaboração mútua em nossa
sociedade. Sejamos promotores da paz de Deus e nos esforcemos para fazer da
nossa fé um instrumento de transformação do mundo, pois a adesão a Cristo só
poderá ser harmoniosa, ser sinal de paz se houver bom relacionamento com as
pessoas.
A
Comunhão
Para sentir essa
profunda comunhão estabelecida na relação de Deus conosco, olhemos para o
próprio rito da Celebração Eucarística. Na sua harmonia, riqueza e
espiritualidade, sentimos a unidade de Cristo no mistério celebrado. Portanto,
a comunhão é o traço característico da nossa fé cristã; e a fé é exatamente a
comunhão perfeita de Deus com o ser humano. Oxalá vivêssemos o que diz a oração
da coleta deste 6º Domingo da Páscoa: “que nossa vida corresponda aos mistérios
que recordamos”. Na Eucaristia, Deus se faz comunhão em Jesus pela força do
Espírito Santo. Isso pressupõe que sem comunhão a Igreja não pode existir, como
também não podemos criar comunhão se não destruirmos as barreiras da
indiferença. Vimos na primeira leitura que a pretensão de impor práticas
judaicas numa comunidade convertida do paganismo criou conflitos; causou
perturbações. Definitivamente compreendemos que a nossa vocação cristã é para a
comunhão porque a Igreja é comunidade de amor. Não esqueçamos que “a Igreja
‘atrai’ quando vive em comunhão, pois os discípulos de Jesus serão reconhecidos
se se amarem uns aos outros como Ele nos amou” (Documento de Aparecida 159). E isso é sério... muito sério. É
lamentável quando há unidade na fé, mas não há comunhão nas relações.
Para viver no amor,
acolher a paz e fazer comunhão, devemos assumir o firme propósito de ser
testemunhas da comunhão de Deus, em Cristo, no Espírito. Lembremo-nos das
palavras de Jesus como um estímulo para fortalecer a nossa fé: “disse-vos isto,
agora, antes que aconteça, para que, quando acontecer, vós acrediteis” (Jo
14,29). Em seu nome, o Pai nos enviará um Defensor (cf. Jo 14,26), para estar
ao nosso lado, para ser sinal da sua presença na vida da comunidade de fé.
Confiantes nessa
agradável companhia, que o nosso amor não seja interesseiro, a nossa paz não
seja ilusória e a nossa comunhão não seja artificial. Sejamos, portanto, conscientes
de que a fé nos leva à comunhão como uma possibilidade de chegar a Deus, mas
não duvidemos de que, para viver em comunhão com Deus, é necessário estar em
comunhão com os irmãos.
Marcos
Bento
2º
Teologia