2º Domingo da Quaresma – Ano A

“Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo o meu agrado. Escutai-o!” (Mt 17,5)


Leituras:
Gn 12,1-4a
Salmo 32
2Tm 1,8b-10
Mt 17,1-9

No 2º domingo da Quaresma somos interpelados pela Palavra de Deus, cuja voz ressoa com mais força em nossa consciência e nos ordena a concentrar nossa atenção em Jesus. A força do imperativo “escutai-O” torna-se abertos à vivência do mistério pascal. Acolhamos a Palavra de Deus reconhecendo na arte da escuta a força para revigorar nossa fé em Cristo. Na Transfiguração do Senhor (Mt 17,1-9) experimentamos a antecipação da glória da ressurreição, ao passo que assumimos uma vida operativa na presença de Deus e em sintonia com Jesus, que em breve abraçará a cruz.

No alto da montanha – biblicamente, o lugar da manifestação divina, onde o ser humano entra em intimidade com Deus – os apóstolos contemplam Jesus na sua forma resplandecente de glória. A luz, símbolo da presença divina, investe no rosto e na roupa, ou seja, envolvendo toda a realidade de Jesus, por dentro e por fora. O aspecto glorioso do Messias só é conhecido através da paixão e morte, pois a glória não elimina a condição humana de Jesus. Na revelação plena de Deus, em Jesus, no alto da montanha, conforme a Lei hebraica, as duas testemunhas são necessárias para comprovar o fato. Elias e Moisés aparecem para recordar o que as profecias e a Lei declaram sobre o Messias. “Pela Paixão e Cruz, chegará a glória da ressurreição” (Prefácio). Elias é o profeta precedente ao Dia do Senhor (Ml 3,22-24) e Moisés é o modelo de profeta, conforme Deus prometera (Dt 18,15).

A partir da experiência inspiradora feita por Pedro, Tiago e João – aqueles que testemunham a ação de Jesus em momentos particularmente importantes como a ressurreição da Filha de Jairo (Mc 5,40) e a oração de Jesus no Getsêmani (Mc 14,33) – somos convocados para a experiência da escuta. A voz que ecoa da nuvem confirma a certeza da nossa fé: “Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo o meu agrado. Escutai-o!” (Mt 17,5). Como está a nossa disposição para escutar os outros? Escutamos Deus?

Um pedido de escuta que se torna aceitação corajosa também é formulado na primeira leitura que narra a vocação de Abraão. Deus exige muito porque ele garante muito. A frase final – “e Abraão partiu, como o Senhor lhe havia dito” (Gn 12,4a) – é mais eficaz do que qualquer descrição psicológica. Em sua grandiosa simplicidade, revela melhor o significado desse evento do que qualquer outra coisa. Abraão faz seu próprio plano divino e se submete a essa palavra difícil, mas capaz de garantir vida e prosperidade. Escutar se torna obediência. Portanto, escutar não é somente ouvir, mas comprometer-se, reagindo ao foi dito. Quando Jesus nos pede para amar, perdoar, acolher, visitar ou evangelizar, nossa resposta precisa ser concreta. A Campanha da Fraternidade quer nos fazer vivenciar isso, “próprio de quem reconhece no próximo o rosto do Filho de Deus” (Oração CF 2020).

A experiência da transfiguração de Jesus também envolve os sentidos dos discípulos. Eles ouvem, veem, são tocados por Jesus (cf. Mt 17,7). O corpo é o sujeito da experiência espiritual e os sentidos corporais nela intervêm. Quando nos permitimos abrir-se para a alteridade, quando nos colocamos em contato com o mundo, nossos sentidos desempenham uma função espiritual incrível. Precisamos resgatar na fé cristã, e em todas as nossas vivências litúrgicas, a riqueza dos nossos sentidos. A unidade da espiritualidade cristã envolve interior e exterior. A conversão, tão suplicada na Quaresma, também.

Dos sentidos, destacamos hoje a audição. “Precisamos nos exercitar na arte de escutar, que é mais do que ouvir. Escutar, na comunicação com o outro, é a capacidade do coração que torna possível a proximidade” (Papa Francisco). Em nossas comunidades eclesiais escutamos com atenção a Liturgia da Palavra? Por meio da Palavra Deus, transmitida por escrito, “Deus continua falando a seu povo” (SC 33). Busquemos dar maior atenção à proclamação das leituras nas Missas e celebrações.

Que possamos crescer na arte de escutar, acolhendo conscientemente os ensinamentos da transfiguração do Senhor. Inspirados pela resposta de fé de Abraão saibamos escutar com qualidade e reconhecer que a voz de Deus implica acolher a realidade da cruz. Sem cruz não há glória; sem escuta não há diálogo. Sejamos obedientes à voz do Senhor. Escutá-Lo dá novo vigor à nossa fé.

Pe. Marcos Bento