A discussão que se estabelece em
torno da redução do ser humano como coisa ou objeto origina-se com base em um
contexto histórico marcado pelo desenvolvimento da indústria, dos avanços
tecnológicos e científicos e, principalmente, da questão capitalista, com
ênfase à produção e ao lucro. Dessa maneira, a primeira observação que se faz,
parte do pressuposto que analisa a realidade em que o ser humano vive, marcada
pelo temível sistema capitalista, que é o estimulador da excessiva produção
industrial e do exorbitante consumismo. Nessa perspectiva, observa-se o aumento
do abandono aos valores que promovem a vida humana, sua dignidade, seus
direitos e deveres, concentrando-se unicamente dimensão econômica com a
perspectiva de aumentar o poder aquisitivo. Trata-se de uma perca de
referenciais na qual as mudanças tendem a instaurar uma nova maneira de
compreender o homem. Como exemplo, basta recordar a preocupação dos noticiários
da televisão para compreender como a questão financeira influencia e movimenta
o mundo, pois, vê-se quotidianamente como que o desempenho diário da bolsa de
valores dá mais audiência aos jornais do que a situação de extrema pobreza que
ainda abala muitas realidades no mundo e as questões éticas e morais que distanciam
os indivíduos de sua humanidade. Ainda nesse sentido, a história moderna muito
contribuiu para a redução do homem à coisa porque além do enfraquecimento da
metafísica, ela alimenta a ideia de que o homem é apenas um instrumento
utilizado na produção e encarregado de consumir desenfreadamente. Outras
contribuições para enriquecer esse fator são o individualismo, o
tecno-cientificismo e a crise religiosa. Sobre isso, uma afirmação de Kant,
“age de tal forma a tratar a humanidade como um fim e jamais simplesmente como
um meio” evidencia o rebaixamento do homem ao estado de coisa, ao mesmo tempo
em que sugere o interesse do filósofo em resgatar a humanidade do homem. Esse
mesmo argumento fora utilizado posteriormente por Marx para alimentar suas
denúncias à exploração do homem pelo homem e a coisificação do trabalhador.
Dessa forma, podem-se destacar duas características imprescindíveis nessa busca
do ser humano pela sua humanidade – o reconhecimento dele como ser distinto dos
demais seres vivos possuindo um arcabouço racional e político e a sua
subjetividade, ou seja, a sua essência humana.
Esse segundo aspecto tende a
adentrar nas questões referentes ao campo da bioética, destinadas (segundo
JAPIASSÚ E MARCONDES, 2006, p. 31) à “abordagem interdisciplinar da filosofia
moral preocupada em elucidar todas as condições exigidas por uma gestão
responsável da vida humana no contexto dos rápidos e complexos progressos das
ciências da vida e das tecnologias biomédicas no mundo contemporâneo”, pois,
como se sabe, alguns temas como os embriões humanos e a venda de órgãos humanos
são estopim para muitas discussões. Uma delas aponta uma indagação que se
sugere para saber se o embrião é uma pessoa ou não – Eis um exemplo notável, em
meio a tantos outros, de coisificação do ser humano. Por causa dessas
ponderações, conclui-se que o homem é atingido por uma catástrofe ética,
corrompida pela lei do mercado cuja preocupação primordial é o lucro. Destarte,
só um caminho razoável poderá resgatar o homem para o seu lugar no mundo,
libertando-o das seduções econômicas que fazem dele uma coisa. Assim, o fator imprescindível
para ‘descoisificar’ o homem está numa meditação que o inspire a pensar naquilo
que faz dele uma pessoa verdadeiramente humana – a sua dignidade – para socorrer
os valores humanos a fim de experimentar com liberdade as qualidades que estão
na essência de sua existência.
Marcos Bento
3º Filosofia