Estamos
conhecendo alguns elementos da celebração do matrimônio na antiguidade. Vimos como acontecia na religiosidade hebraica e no
mundo grego e romano dos séculos mais antigos. Hoje, vamos acrescentar mais
alguns detalhes da realidade romana, assim como pode ser reconstruída através
dos testemunhos dos escritores da época. Trata-se de alguns elementos mais
comuns, pois cada região tinha suas particularidades e, ainda, o novo sempre demora
a se impor, permanecendo por muito tempo hábitos e tradições do passado.
A decisão de
‘empenhar’ a filha com o futuro esposo pertencia ao pai. Ele combinava a tratativa
– dita sponsio - para o casamento. Com
esse ato, os dois já se empenhavam reciprocamente e se tornavam membros do
parentesco. O pai da noiva devia definir o ‘dote’ (a palavra vem de um verbo
grego que significa ‘doar’; era uma antecipação da herança paterna) para a
filha. Nesta época, o contrato acontece ‘na palavra’ e com a presença de testemunhas.
Alguns escritores
da época (por ex. os poetas Virgílio e Ovídio) documentam que os dois estreitavam
a mão direita um do outro para expressar o recíproco empenho. Já no I século d.C.
sabemos que o noivo enviava à sua futura esposa um anel[1]
como sinal desse empenho para com ela; a esposa o colocava no dedo anular, em sinal
do compromisso com ele. Como garantes da fidelidade eram invocadas as
divindades. Às vezes, acontecia um banquete para expressar, ao redor da mesa, a
união entre as duas famílias.
Além dos deuses
da família (os Penates) destacavam-se
Venus, Júpiter (Zeus), Juno (Hera), Ceres, Mercúrio. Ao sacrifício à divindade,
seguia o banquete de casamento, de costume na casa da esposa. No banquete
(pelas cinco da tarde), tinha o ‘mestre sala’ (cf. João 2, 8) e os que participavam
da ceia deviam ter a cabeça coberta com guirlandas de flores.
O rito na casa
do pai da esposa, depois, passou para os públicos templos, também se a intervenção
dos sacerdotes acontecia, sobretudo com as classes mais ricas. No templo se
celebrava um rito – chamado confarreatio
– que consistia em sacrificar ao deus Júpiter um bolo de ‘farro’ (espécie
de trigo) do qual comiam os esposos; o rito acontecia diante do sacerdote e de
dez testemunhas. Sacrificava-se ao deus uma ovelha e seguiam várias preces,
enquanto os esposos ficavam sentados um ao lado do outro sobre banquinhos
amarrados, e um véu cobria (nubere,
em latim, daí nupcias e nubentes = ‘cobertos’)
suas cabeças.
Depois do solene
banquete, ao anoitecer, acontecia o cortejo até a casa do esposo; o caminho
estava iluminado por muitas tochas e tocadores alegravam a caminhada. Tudo era
realizado em atitude religiosa. Em alguns lugares, tinha o sacrifício (porco,
boi, bezerra) às divindades ‘especializadas’ em defender o casamento. Entrando
na casa do marido, a esposa dizia: “Onde tu estiveres (Caio), eu também (Caia)
estarei”. No caminho, às crianças eram doadas nozes, provavelmente como voto de
fecundidade e prosperidade. A esposa vestia um hábito branco, muito simples e
amarrado; os cabelos eram divididos em seis tranças e coberto por uma guirlanda
de verduras.
Muitas outras
cerimônias e diferentes orações às divindades da família acompanhavam a entrada
na nova casa, até os noivos chegarem ao quarto nupcial. Aos poucos, porém, observa-se
uma decadência do sentimento religioso. “Fogo sagrado e pão sacrifical são
substituídos por um documento legal” (C. Fernández).
Dom Armando
[1] Anel vem de anulus,
diminutivo de amnis =
serpente; a forma de anel era de uma
pequena serpente, talvez símbolo da fertilidade e da virilidade.