“Vai e faze a mesma coisa” (Lc 10,37b)
Leituras:
1ª
Leitura: Dt 30,10-14
Salmo
– Sl 68,14.17.30-31.33- 34.36ab.37
2ª
Leitura: Cl 1,15-20
Evangelho:
Lc 10,25-37
Como testemunhamos nossa fidelidade ao Senhor? Será que mantendo fiéis
às ordens, preceitos e mandamentos, estaremos realizando a vontade de Deus?
Somos motivados a olhar para nossa vida e a descobrir um elemento decisivo da
nossa caminhada de fé: o que carregamos em nosso coração. Isso nos levará a uma
profunda mudança interior, fazendo-nos romper com nossa mentalidade fechada no
rigorismo da Lei.
É evidente que não basta decorar a Lei de Deus e repeti-la como um
refrão cotidiano. A grandeza e a profundidade dos preceitos divinos não são
comprovadas simplesmente porque estes ficaram registrados em documentos, mas
por causa da sua aplicação. Por isso, a verdadeira a eficácia da Lei nada mais
é que o esforço humana para aplicá-la, a fim de percebermos que o mandamento, a
sabedoria, o dom de Deus, não está no céu para que perguntemos: “quem subirá ao
céu por nós para apanhá-lo?’” (Dt 30,12), mas está próximo de nós, bem ao nosso
lado.
Essa garantia da proximidade do mandamento do Senhor mostra que temos
potencialidade para tentar obedecê-lo. O problema é quando nos fixamos na lei
pela lei e concentramos na sua observância simplesmente por mero rigorismo.
Olhando para a figura do mestre da Lei, presente no Evangelho deste domingo,
notamos que sua grande dúvida, ‘e quem é o meu próximo?’” (Lc 10,29b) confirma
sua preocupação em apenas cumprir preceitos. Em contrapartida, quando olhamos
para Jesus, percebemos o contrário. Ao invés de se ocupar com o legalismo
religioso infértil, ele mostra que a verdadeira obediência à Lei é acompanhada
do amor, sobretudo quando direcionado para quem mais necessita, ou seja, os
marginalizados.
Diante disso nos perguntamos: O que nos identifica como cristãos? A
preocupação com a obediência às doutrinas? Uma primeira indicação para
respondermos a estas perguntas é a compreensão que temos de Jesus. Em nosso
tempo, Jesus é apresentado perigosamente a partir de tantas versões que sua
pessoa, mensagem e missão acabam sendo extremamente deturpadas. Portanto,
olhemos para Aquele que depositamos nossa fé e vejamos se Ele é um intocável,
somente divino e triunfalista, ou então, se é aquele do Evangelho, definido
como o rosto da misericórdia do Pai, que se empenha em aliviar os sofrimentos,
e que foi enviado para que todos tivessem vida plena.
O ensinamento de nosso Mestre, através da parábola do Bom Samaritano,
convida-nos para uma grande mudança que nos permita olhar para os que sofrem e
ter compaixão. Poderíamos esperar desta parábola o contrário, já que os
primeiros a encontrar o homem que fora assaltado e estava quase morto no chão,
foram religiosos (sacerdote e levita). Entretanto, para não transgredir a Lei
“aquele que tocar um cadáver, ainda que seja morto, ficará impuro sete dias”
(Nm 19,11) e ainda, “todo aquele que tocar um morto, o corpo de alguém que
morreu, e não se purificar, contamina a Habitação de Iahweh” (Nm 19,13), os
dois passam e mesmo vendo o homem caído, continuam andando.
Para eles, as celebrações do culto sagrado e as demais ocupações no
Templo são mais importantes. O que nos inquieta é a ausência do sentimento de
compaixão em pessoas tão dedicadas ao serviço de Deus. Geralmente nós esperamos
que as pessoas que mantêm contato com as coisas sagradas, sejam as primeiras a
testemunharem com gestos concretos o que celebram nas igrejas. Porém, somos
surpreendidos por todos os lados com os exemplos ‘de fora’.
Ao pensar em nossa realidade brasileira, não apenas naquilo que é
noticiado pela mídia, mas nos acontecimentos das nossas comunidades, vemos
tantas situações de corrupção, violência e sofrimento e não questionamos
tampouco agimos, para não ‘ofender’ a Lei. Talvez isso devido a nossa
dificuldade de reconhecer quem é o próximo.
Nesse caso, Jesus, nosso Mestre,
ensina-nos que o nosso próximo é aquele a quem nós aproximamos. Por isso, a
novidade do Evangelho deve produzir efeitos transformantes em nossa vida e
tornar nosso coração generoso, ajudando-nos a aproximar das pessoas com amor
fraterno, para testemunhar a misericórdia de Deus.
Portanto, não precisamos saber se aqueles que sofrem estão ou não
próximos de nós. O samaritano é reconhecido como bom exatamente por agir com
compaixão. E olha que ele não conhecia o homem caído, pois era apenas um
viajante, muito menos sequer fazia parte do povo eleito de Israel. Mas com seu
coração generoso nos mostrou que para ganhar a vida eterna devemos praticar a
misericórdia.
Marcos Bento, 2º Teologia