Salmo: Sl 145,7.8-9a.9bc-10 (R. Mt 5,3)
2ª Leitura: 1Cor 1, 26-31
Evangelho: Mt 5,1-12a
Como
purificaremos nossos corações para uma vida feliz? Fechando os olhos para o mundo e abrindo-os
somente diante do nosso espelho? Desconectando-os da realidade social cuja
violência se tornou cartão-postal de nossas cidades? Mas será que conseguiremos ver a Deus dessa
maneira? Naturalmente não, é difícil enxergar Deus quando não se olha para o
próximo.
Jürgen
Moltmann já dizia que “Deus sofre onde sofre o amor”. E a realidade que se
apresenta aos nossos olhos confirma exatamente que o amor está sofrendo:
violência doméstica, tráfico de drogas, corrupção política, degradação
ambiental, perseguições, terrorismo, guerras civis, e, dentre tantos outros
acontecimentos, um está aumentando e causando muitas mortes, a crise do sistema
presidiário brasileiro. Tudo isso coloca a vida em perigo. Diante desses fatos
inacreditáveis, que será que Deus está nos mostrando? Qual o clamor dessa
realidade?
São
questões perturbadoras cujas respostas não são imediatas, contudo uma exigência
vai se revelando: precisamos lutar contra a violência, destruir aquela que nos
destrói. Para isso, inspira-nos o tema presente na Liturgia da Palavra deste 4º
Domingo Comum: as bem-aventuranças.
Trata-se de um caminho significativo e escandaloso. É um caminho significativo
porque nos leva a conhecer já nesta terra a felicidade vivida e experimentada
pelo próprio Jesus, confirmando em nossa existência a certeza da nossa fé, ou
seja, Deus quer a nossa felicidade ainda nesta vida, não só a partir da morte.
Escandaloso porque não é um caminho fácil, exige conversão (mudança de consciência
e de atitudes) para tornar o coração sensível e transparente, a fim de acolher
com maior abertura as promessas do Reino. E isso pode escandalizar...
As
bem-aventuranças integram o Sermão da Montanha (Mt 5,3-7-27) na qual a não
violência ocupa lugar de destaque. É o momento que, para Mateus, Jesus atualiza
a Lei. Por isso, assim como Moisés, Jesus sobre ao monte e fala em nome do Pai.
Neste ensinamento Jesus apresenta o rosto compassivo de Deus, que não é apático
ou insensível aos sofrimentos humanos. Com efeito, nossa fé cristã nos convida
a conhecer, amar e seguir o amigo dos que sofrem, Aquele que foi crucificado,
que sofreu junto com os abandonados deste mundo: o Deus das bem-aventuranças.
Fazer
a experiência deste Deus requer humildade para reconhecê-Lo entre os mais
simples e coragem para ir na contramão da sociedade escrava das riquezas
materiais e dos prazeres comercializados que aponta a felicidade por caminhos
equivocados, quase sempre levando ao desastre. Não queremos comprar a
felicidade, mas alcançá-la em decorrência do nosso empenho na realização da
justiça, da vivência segundo a lei do Senhor. Nesse sentido, precisamos assumir
uma postura diferente, não a da maioria. Olhando para o Evangelho, no momento
que Jesus subiu ao monte para ensinar, os discípulos (grupo menor) se
aproximaram dele, isto é, foram ao seu encontro, ao contrário da multidão ali
presente. Vamos fazer o mesmo! Como discípulos e discípulas do Mestre, devemos escutá-lo
mais de perto para que nosso testemunho de fé encontre a autêntica felicidade.
Verdadeiramente,
são bem-aventurados os que se decidem a viver a partir da lei do Senhor, agem
na justiça. Em outras palavras, os que aceitam o convite da profecia de
Sofonias (1ª leitura), ou seja, encontram a conversão a partir da busca do
Senhor para não mais praticar a iniquidade, opondo-se ao exercício da injustiça.
Sofonias é o profeta da não violência, para ele, será o povo humilde que possuirá
a terra, não os que confiam na brutalidade das armas. Portanto, são bem-aventurados
os que se revestem de fragilidade por não portar armas, mas lutam pela promoção
da justiça e vivem com retidão. Como ensina Paulo (2ª leitura), “Deus escolheu o que o mundo considera como
fraco, para assim confundir o que é forte. Deus escolheu o que para o mundo é
sem importância e desprezado, o que não tem nenhuma serventia, para assim
mostrar a inutilidade do que é considerado importante” (1Cor 1,17-28).
Sejamos
bem-aventurados, vamos procurar viver os ensinamentos de Jesus e cultivar uma
vida justa. No sentido moral a justiça é compreendida enquanto obediência aos
princípios éticos que regem todo indivíduo e, do ponto de vista social,
refere-se à obediência às leis da sociedade. Contudo, precisamos ser
diferentes. Na luta contra a violência e a superlotação dos presídios, por
exemplo, sejamos protagonista da esperança a partir da educação. Não será a
construção de mais presídios que vai solucionar todos os problemas para quem
transgride a lei no país, mas a educação. A educação é revolucionária e abre
caminho para uma nova vida porque nos ajuda a humanizar-nos e humanizar os
outros, principalmente a partir da convivência, do diálogo e do respeito.
As
bem-aventuranças são inesgotáveis, sempre trazem novas ressonâncias. Há sempre
uma luz diferente para o momento que estamos vivendo. Nossa realidade
marcadamente ofendida pela violência e a injustiça nos incita a reavivar em nós
a esperança, orientando-nos para uma vida conforme a Lei do Senhor. Assim, a
felicidade não será apenas um discurso bonito e utópico, mas realidade presente
na vida da Igreja e da sociedade. Peçamos ao Senhor que aumente a nossa fé e
revigore nossa esperança para caminharmos na verdade de Jesus e espalhar o
espírito das bem-aventuranças com humildade. Assim contagiaremos cada um com a
paz de Jesus que o mundo não pode dar. E um dia veremos a Deus e acolheremos o
Reino dos Céus.
Marcos Bento –
3º Teologia