Domingo 32º do Tempo Comum (Ano C)

LEITURAS

I: 2º Livro dos Macabeus 7,1-2. 9-14
Salmo 16
II: 2ª Carta aos Tessalonicenses 2,16 -3,5
Evangelho: Lucas 20,27-38


Há poucos dias fizemos memória dos nossos entes queridos que deixaram a vida terrena e visitamos os cemitérios para, junto com uma flor, depositar uma oração. Às lembranças das pessoas queridas se une, talvez, uma esperança. Esperança de vida que a morte não destrói.  Para os cristãos, é Esperança que se alimenta na fé em Jesus, o Filho de Deus que ressuscitou dentre os mortos e, como escreve são Paulo (II leitura) “nos proporcionou uma consolação eterna e feliz esperança”.
Creio na ressurreição da carne”, proclamamos a todo domingo em nossa profissão de fé. O sentido dessa profissão é assunto da Palavra deste Domingo. Questão antiga se, já no Antigo Testamento, recebe destaque e interpretações diferentes como deixa entrever o texto do Evangelho.
O povo de Israel só aos poucos foi se abrindo a uma perspectiva de ressurreição. Por muito tempo a única esperança era de uma abençoada vida terrena e uma numerosa descendência. Depois da morte – assim se acreditava – o falecido ia morar numa região subterrânea – o Scheól – longe do mundo dos vivos e do Deus vivo. Neste lugar – afirmam até alguns textos (ex. Salmo 6,6; 88,12; Is 38,18) – é impossível louvar a Deus e celebrar sua fidelidade. Textos do livro de Eclesiastes e outros livros sapienciais consideram a vida terrena mais ou menos como muitos hoje que, educados a uma mentalidade científica, consideram verdadeiro só o que se pode verificar com os instrumentos da ciência.
Mas, uns cem anos antes de Jesus, aparece um escrito – que conta histórias da resistência hebraica dos meados do II século. O rei grego Antíoco IV Epifânio queria impor a todos os seus súditos a cultura grega, com seus hábitos éticos e religiosos. Uma família judaica, porém, recusa-se a comer carne de porco e prefere a morte, antes de violar a lei de seu povo, e professa, com heroica coragem, a fé na ressurreição dos mortos: “prefiro ser morto pelos homens tendo em vista a esperança dada por Deus, que um dia nos ressuscitará”, afirma o quarto filho (I leitura). Afirma-se, desse modo, a convicção de que, para quem morre a causa de sua fidelidade a Deus, Deus mesmo devolverá integralmente a vida, isto é, ressurgirá com o corpo.
No Salmo a Assembleia canta confiante: “Eu verei, justificado, a vossa face e ao despertar me saciará vossa presença”.
O Evangelho apresenta Jesus que entra em mais um conflito. Desta vez, com os saduceus, aristocratas e donos de terras, que vivem a religião como elemento de estabilidade social, mas que não acreditam em anjos nem em ressurreição. Com atitude arrogante, questionam Jesus, mais para zombar dele do que para pedir opinião. Contam uma... piada, a da mulher que pela lei hebraica, que impunha ao irmão casar-se com a viúva, teria a mesma casado com sete irmãos: “na ressurreição ela será esposa de quem?”, perguntam irônicos.
Jesus não dá, propriamente, uma resposta. Eles não a estavam procurando e, portanto, seria inútil! Jesus, porém, permanecendo no mesmo terreno – a Lei mosaica – põe a questão: “Moisés... chama o Senhor de ‘o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó’. Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos, pois todos vivem por ele”.
Numerosas reflexões poderíamos acrescentar a esse respeito. Só reafirmamos que o Deus que Jesus nos deu a conhecer é Deus da vida, que quer a vida e Jesus mesmo veio trazer ‘vida em abundância’; Ele é Vida e Ressurreição (João), Ele é o Ressuscitado, o Primogênito de entre os mortos (Ap) e princípio da nova ressurreição.
Hoje em dia, objeções parecidas com as dos Saduceus retornam e tomam conta de mentes e corações de tantas pessoas. É tão difícil acreditar e acolher o sonho e o projeto de Deus que Jesus revelou, talvez porque pareça tão grande e bonito demais; ou, talvez, porque muitos perderam a simplicidade dos ‘puros de coração’ e não conseguem se abrir às coisas mais autênticas que Deus proporciona aos seus filhos e filhas. E o coração humano, criado pela eternidade e a plenitude que só em Deus se encontram, busca, em outras fontes, água que, às (tantas?) vezes é água poluída, quando as fontes não estão secas.
Mas... será que estamos procurando ou, como os saduceus, sabemos só fazer piadas sobre as coisas mais importantes da  vida e até zombar dos que procuram viver e testemunhar sua fé? Cada um(a) examine a si mesmo: “como vivo minha fé (ou falta de fé) na ressurreição ‘da carne’? Acredito mesmo ou prefiro não pensar ou viver na autossuficiência de respostas que parecem lógicas e razoáveis, mas que... não respondem?”
A Eucaristia que celebramos é, acima de tudo, uma grande profissão de fé na ressurreição do Senhor. No momento mais alto da celebração, com palavras do apóstolo Paulo, proclamamos: “Todas as vezes que comemos deste pão e bebemos deste cálice, anunciamos, Senhor, a vossa morte, enquanto esperamos a vossa vinda”.
Desejo que a participação na Eucaristia fortaleça nossa caminhada de fé e nos faça crescer na unidade do amor.
Dom Armando