A história do
matrimônio é complexa e diferente segundo os tempos e lugares. Estas anotações
pretendem oferecer somente algumas informações históricas para compreendermos o
sentido do que nós hoje vivemos e, sobretudo, celebramos quando a Igreja acolhe
os noivos – um homem e uma mulher – os quais, diante de Deus e da Comunidade
eclesial, manifestam seu recíproco empenho de amor e fidelidade.
Depois de ter considerado
alguns elementos da praxe judaica na celebração do matrimônio, vamos conhecer
alguns aspectos da celebração do matrimônio no mundo greco-romano nos séculos
mais antigos (VII - V a.C).
Na família
romana o elemento mais importante era ‘o fogo sagrado do lar’. Na entrada da
casa tinha o lugar sagrado onde se encontravam os Lares ou Poenates – as divindades da família - diante dos
quais devia brilhar sempre o fogo sagrado. “Esse fogo era o centro da liturgia
familiar. Ali se recitavam as preces. A família estava unida se no lar ardesse
o fogo sagrado”[1].
Manter aceso o fogo era dever do pai e do filho mais velho. “A procriação era
consequência, não fim do matrimônio. Devia-se procriar para garantir que o fogo
sagrado ficasse aceso”. A família do mundo greco-romano antigo se construía ao
redor do fogo sagrado aceso pelos pais; a família tinha um caráter
profundamente religioso.
O rito mais
antigo da celebração matrimonial consistia na traditio puellae (a entrega da moça) que o pai fazia colocando a
filha nas mãos do noivo, depois de ter feito o sacrifício aos Poenates em clima de festa. Seguia a
procissão da casa paterna à casa do esposo. A noiva, coberta por um véu e bem
enfeitada, era levada para a nova casa; o vestido branco em uso era o das Vestais, as moças encarregadas de manter
sempre aceso o fogo sagrado para a comunidade.
Chegando à casa
do esposo, a noiva não podia entrar. O noivo devia tomá-la nos braços e introduzi-la
na nova comunidade religiosa. Diante do fogo sagrado, os dois deviam se lavar
com água lustral, água com a qual se toca o fogo. Depois de uma oração,
oferecia-se um sacrifício com um pão sagrado, comido por ambos. Nisso estava a
essência do rito do matrimônio: participar do pão sagrado diante do fogo do
novo lar.
Na família
greco-romana desse período, a procriação é meio para garantir a indissolubilidade.
O nascimento do filho é marcado pela presença do fogo; dez dias depois de nascido,
o filho é levado diante do fogo sagrado e o pai deve reconhecer – ou rejeitar –
o filho. O pai de família exerce a função de sacerdote dessa liturgia; ele
tinha o poder sobre a família toda, que compreendia filhos, servos e bens. Em sua
ausência, era a mãe que assumia o poder.
Podemos observar
como, em sua origem, o matrimônio é vivido como algo sagrado, dentro de uma
religiosidade repleta dos valores essenciais para uma vida equilibrada e ordenada.
Nos séculos seguintes – iremos ver – todo esse clima religioso, pouco a pouco, foi
murchando e muda também o modo de realizar o matrimônio.
Dom Armando
[1]
Estas informações encontramos no artigo Matrimônio
de C. Fernández Fernández, in AA. VV. Manual de liturgia III. A celebração do mistério pascal. Os
Sacramentos: sinais do mistério pascal. São
Paulo: Paulus, 2005, p.271ss.