4º Domingo Comum – Ano A

“Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus” (Mt 5,8)

1ª Leitura: Sf 2,3; 3,12-13
Salmo: Sl 145,7.8-9a.9bc-10 (R. Mt 5,3)
2ª Leitura: 1Cor 1, 26-31
Evangelho: Mt 5,1-12a

Como purificaremos nossos corações para uma vida feliz?  Fechando os olhos para o mundo e abrindo-os somente diante do nosso espelho? Desconectando-os da realidade social cuja violência se tornou cartão-postal de nossas cidades?  Mas será que conseguiremos ver a Deus dessa maneira? Naturalmente não, é difícil enxergar Deus quando não se olha para o próximo.
Jürgen Moltmann já dizia que “Deus sofre onde sofre o amor”. E a realidade que se apresenta aos nossos olhos confirma exatamente que o amor está sofrendo: violência doméstica, tráfico de drogas, corrupção política, degradação ambiental, perseguições, terrorismo, guerras civis, e, dentre tantos outros acontecimentos, um está aumentando e causando muitas mortes, a crise do sistema presidiário brasileiro. Tudo isso coloca a vida em perigo. Diante desses fatos inacreditáveis, que será que Deus está nos mostrando? Qual o clamor dessa realidade?
São questões perturbadoras cujas respostas não são imediatas, contudo uma exigência vai se revelando: precisamos lutar contra a violência, destruir aquela que nos destrói. Para isso, inspira-nos o tema presente na Liturgia da Palavra deste 4º Domingo Comum: as bem-aventuranças. Trata-se de um caminho significativo e escandaloso. É um caminho significativo porque nos leva a conhecer já nesta terra a felicidade vivida e experimentada pelo próprio Jesus, confirmando em nossa existência a certeza da nossa fé, ou seja, Deus quer a nossa felicidade ainda nesta vida, não só a partir da morte. Escandaloso porque não é um caminho fácil, exige conversão (mudança de consciência e de atitudes) para tornar o coração sensível e transparente, a fim de acolher com maior abertura as promessas do Reino. E isso pode escandalizar...
As bem-aventuranças integram o Sermão da Montanha (Mt 5,3-7-27) na qual a não violência ocupa lugar de destaque. É o momento que, para Mateus, Jesus atualiza a Lei. Por isso, assim como Moisés, Jesus sobre ao monte e fala em nome do Pai. Neste ensinamento Jesus apresenta o rosto compassivo de Deus, que não é apático ou insensível aos sofrimentos humanos. Com efeito, nossa fé cristã nos convida a conhecer, amar e seguir o amigo dos que sofrem, Aquele que foi crucificado, que sofreu junto com os abandonados deste mundo: o Deus das bem-aventuranças.
Fazer a experiência deste Deus requer humildade para reconhecê-Lo entre os mais simples e coragem para ir na contramão da sociedade escrava das riquezas materiais e dos prazeres comercializados que aponta a felicidade por caminhos equivocados, quase sempre levando ao desastre. Não queremos comprar a felicidade, mas alcançá-la em decorrência do nosso empenho na realização da justiça, da vivência segundo a lei do Senhor. Nesse sentido, precisamos assumir uma postura diferente, não a da maioria. Olhando para o Evangelho, no momento que Jesus subiu ao monte para ensinar, os discípulos (grupo menor) se aproximaram dele, isto é, foram ao seu encontro, ao contrário da multidão ali presente. Vamos fazer o mesmo! Como discípulos e discípulas do Mestre, devemos escutá-lo mais de perto para que nosso testemunho de fé encontre a autêntica felicidade.
Verdadeiramente, são bem-aventurados os que se decidem a viver a partir da lei do Senhor, agem na justiça. Em outras palavras, os que aceitam o convite da profecia de Sofonias (1ª leitura), ou seja, encontram a conversão a partir da busca do Senhor para não mais praticar a iniquidade, opondo-se ao exercício da injustiça. Sofonias é o profeta da não violência, para ele, será o povo humilde que possuirá a terra, não os que confiam na brutalidade das armas. Portanto, são bem-aventurados os que se revestem de fragilidade por não portar armas, mas lutam pela promoção da justiça e vivem com retidão. Como ensina Paulo (2ª leitura), “Deus escolheu o que o mundo considera como fraco, para assim confundir o que é forte. Deus escolheu o que para o mundo é sem importância e desprezado, o que não tem nenhuma serventia, para assim mostrar a inutilidade do que é considerado importante” (1Cor 1,17-28).
Sejamos bem-aventurados, vamos procurar viver os ensinamentos de Jesus e cultivar uma vida justa. No sentido moral a justiça é compreendida enquanto obediência aos princípios éticos que regem todo indivíduo e, do ponto de vista social, refere-se à obediência às leis da sociedade. Contudo, precisamos ser diferentes. Na luta contra a violência e a superlotação dos presídios, por exemplo, sejamos protagonista da esperança a partir da educação. Não será a construção de mais presídios que vai solucionar todos os problemas para quem transgride a lei no país, mas a educação. A educação é revolucionária e abre caminho para uma nova vida porque nos ajuda a humanizar-nos e humanizar os outros, principalmente a partir da convivência, do diálogo e do respeito.
As bem-aventuranças são inesgotáveis, sempre trazem novas ressonâncias. Há sempre uma luz diferente para o momento que estamos vivendo. Nossa realidade marcadamente ofendida pela violência e a injustiça nos incita a reavivar em nós a esperança, orientando-nos para uma vida conforme a Lei do Senhor. Assim, a felicidade não será apenas um discurso bonito e utópico, mas realidade presente na vida da Igreja e da sociedade. Peçamos ao Senhor que aumente a nossa fé e revigore nossa esperança para caminharmos na verdade de Jesus e espalhar o espírito das bem-aventuranças com humildade. Assim contagiaremos cada um com a paz de Jesus que o mundo não pode dar. E um dia veremos a Deus e acolheremos o Reino dos Céus.


Marcos Bento – 3º Teologia