A Eucaristia
(E.) é algo fundamental para a vida cristã. Nossa fé na E. determina a
identidade de nossa fé. Quando Jesus, em Cafarnaum, puxou a conversa pela
primeira vez sobre o assunto, falando do pão vivo que desceu do céu,
logo apareceu o desafio de uma escolha determinada pela fé. Alguns acharam duro
o discurso e se mandaram (cf. Jo 6, 66). A atitude de Jesus nesta
circunstância é muito determinada Vocês também querem ir embora? (ib.,
67). Vamos refletir, mais uma vez, a respeito deste grande mistério da fé.
A Eucaristia em sua origem. A E.
se coloca no contexto da Páscoa, na hora da grande passagem de Jesus deste mundo para o pai (Jo
13,1). Como chefe de família, Jesus estava reunido com seus discípulos para faze
memória dos acontecimentos marcantes da história de seu povo. Recorda que
seus antepassados eram um grupo de escravos, sem dignidade e sem liberdade,
quando, em nome da fé no deus de seus pais, que se proclamava como único
senhor, foram se juntando e lutando para fugir daquela situação de opressão e
de morte. Foi duro! Mas conseguiram.
Esta
libertação é interpretada pela fé, uma fé que transforma e define toda a
vida futura deste povo. O fato “luta de libertação” é lido à luz da fé: ‘Deus –
JHWH – veio nos libertar’. Por isso, o chamam de Goel, o Libertador.
Este acontecimento é celebrado a todo ano. Nisso está o fundamento da
Páscoa hebraica, festa que já existia, mas ligada ao ciclo da natureza, das
estações. De agora em diante, será festa ligada à história, e deve ser
celebrada, para ser atualizada por todos os membros deste povo. A moldura externa
é de uma ceia. É chamada de memorial – ziqquaron –
no sentido que o evento é atualizado ‘por todas as gerações’, com toda a sua
eficácia salvífica.
Jesus escolhe esse gesto, mas introduz uma novidade. No centro não está
mais o cordeiro pascal, mas Ele mesmo. Assim, como teria entregado totalmente e
livremente se mesmo à morte na hora de sua paixão, Jesus, no contexto da Ceia
pascal, dá seu corpo e seu sangue aos irmãos como pão doado e como vinho
derramado. Estes gestos são profecia – sinal que antecipam o
que Ele mesmo está preste a fazer. Celebrando agora, ó Pai, a memória do
vosso Filho, da sua paixão que nos salva... nós vos oferecemos em ação de graças
este sacrifício de vida e santidade (OE III).
Memória e oferenda de si,
a E., ainda, é prece de intercessão. Pedimos a Deus para que continue
hoje, na Igreja, a sua obra de salvação: Olhai com bondade...
Enfim, a E. é presença real de Cristo Redentor. A presença de
Jesus em sua Igreja se realiza de várias maneiras: na Assembléia reunida, em
sua Palavra, na pessoa do Ministro, e, de maneira especial, nas Espécies
eucarísticas. Esta presença se torna possível somente pela fé. Nós
abrimos as portas a Cristo, acolhemos a presença de um Amigo que se doa e nos
chama. É um presente que pede de ser aceito, desejado, procurado por quem tem
fome e experimenta que precisa de salvação e de perdão.
A E. é banquete: façam isso, disse Jesus concluindo a
Ceia pascal. Este banquete se torna sinal que reveste - e com torna presente - o
evento pascal. Este jantar sacia nossa fome de Deus e nossa sede de salvação. O
‘façam isso’ não
significa repetir um gesto convencional e vazio, mas entrar no mistério do
mesmo amor de Cristo, fazendo o que Ele fez, ‘com o mesmo amor, prontos a nos doar’.
Quem vai à E. simplesmente para procurar méritos, fechado no egoísmo espiritual
que isola dos outros, não discerne o corpo de Cristo (1 Cor 11,29).
Entendemos, assim, que este banquete de fraternidade não pode ser
vivido, com verdade, sem superar preconceitos e exclusões; ao contrário,
convida-nos a buscar comunhão e fraternidade em todas as situações da vida.
Dom Armando